O comodismo humano e a generalidade das IA

A bola da vez de todos os males é o ChatGPT – que eu passarei a chamar de Chato do Gepeto – e seus primos. Agora todos os problemas do mundo serão trazidos pelos sistemas de Inteligência Artificial, já descobriram agora, mas que ferramentas como o Grammarly e Rytr já existem há algum tempo, só não eram famosinhos. Mas o problema é da IA ou do comodismo humano e sua eterna preguiça de pensar?

Numa matéria claramente importada da gringa, o Globo critica o uso o Chato do Gepeto dizendo que algumas escolas públicas na cidade de Nova York e Seattle proibiram o uso de ferramentas de IA e até mesmo dispositivos Wi-Fi (celular, vocês, sabem) da escola para evitar trapaças, embora os alunos possam encontrar facilmente alternativas.

Esta frase não faz sentido! Se não pode usar dispositivos Wi-Fi, vão usar o Chato do Gepeto Como? No PC do colégio? Bloquear os inúmeros sites será um pesadelo, como foi um pesadelo aqui no Brasil bloquear o Orkut em tempos d’antanho.

Não vejo diferença entre usar o Chato do Gepeto (vou usar ChatGPT, mesmo, porque são menos letras) e simplesmente copiar e colar algo de algum site da internet. Alguns imprimem direto, indo até o rodapé do site e que se dane. O problema é o sistema de IA?

Um tal professor Christian Terwiesch, da Faculdade de Negócios da Universidade Pensilvânia, testou a capacidade do ChatGPT e identificou que ele seria aprovado em disciplina central para receber o diploma do MBA em Wharton. Só que não é só em termos de finanças e negócios que este sistema é bom. O ChatGPT também passou nos exames de licenciamento médico dos EUA “sem estudar”.

O problema é da IA ou das provas? Vamos fazer um teste.

Quanto mais genérica a pergunta, melhor ele se sai. No segundo, não há um mecanismo da reação propriamente dito e sim uma descrição. Eu poderia aceitar, mas já ficaria com o pé atrás, pois, eu não ensinaria assim. O terceiro, ele se embanana.

Se eu tenho 36 mols de um e 83 do outro, logo, o limitante é quem tem menos. Se a reação é 1:1, então, era para se ter produzido 36 mols de NaHSO4.

Então, o que podemos concluir? Se a pergunta é genérica, a resposta poderá ser genérica. Se qualquer googlada responde a pergunta, o teste não está avaliando seu conhecimento e sim sua memória.

Em outra reportagem d’O Globo, vem a crítica que os sistemas de IA podem afetar a indústria fonográfica, trazendo problemas para compositores e dando um nó nos sistemas de direito autoral.

Um parágrafo que eu achei interessante foi o que disse “No mundo acadêmico, há preocupação maior. Na música, se ela for de baixa complexidade de composição, há o risco de uma ferramenta do tipo substituir o ser humano.”

Baixa complexidade. Vejamos. Pedi pro ChatGPT compor uma música romântica. Saiu:

Nos teus olhos vejo o universo
És o sol que ilumina o meu caminho
Não há nada mais lindo, não há nada mais verdadeiro
Do que o amor que sinto por ti

Você é o meu amor, a minha vida
Você é o sol que ilumina os meus dias
Não há nada mais bonito, não há nada mais verdadeiro
Do que o amor que sinto por ti

És a minha paz, és a minha luz
És a minha força, és a minha luz
Você me faz sentir completo, você me faz sentir vivo
O amor que tenho por ti é eterno

Na boa, achei meh. Vejamos Rosa.

Tu és
Divina e graciosa, estátua majestosa
Do amor, por Deus esculturada
E formada com ardor
Da alma, da mais linda flor, de mais ativo olor
Que na vida é preferida pelo beija-flor

Se Deus
Me fora tão clemente aqui neste ambiente
De luz, formada numa tela, deslumbrante e bela
O teu coração junto ao meu, lanceado
Pregado e crucificado sobre a rósea cruz
Do arfante peito teu

Tu és
A forma ideal, estátua magistral, ó alma perenal
Do meu primeiro amor, sublime amor
Tu és
De Deus, a soberana flor
Tu és
De Deus, a criação, que em todo coração sepultas o amor
O riso, a fé, a dor, em sândalos olentes, cheios de sabor
Em vozes tão dolentes, como um sonho em flor

És láctea estrela
És mãe da realeza
És tudo, enfim, que tem de belo
Em todo resplendor da santa natureza

Perdão
Se ouso confessar que eu hei de sempre amar-te
Ó flor, meu peito não resiste
Ó meu Deus, quanto é triste
A incerteza de um amor que mais me faz penar e em esperar
Em conduzir-te um dia ao pé do altar

Jurar
Aos pés do Onipotente, em prece comovente
De dor, e receber a unção de tua gratidão
Depois de remir meus desejos em nuvens de beijos
Hei de te envolver até meu padecer de todo fenecer

Esta música, esta poesia maravilhosa foi composta por um mecânico de baixa instrução chamado Otávio de Souza, morador do subúrbio do Rio, que mostrou a Pixinguinha a letra. Pixinguinha adorou a música e musicou-a. O primeiro a gravá-la foi Orlando Silva e o resto é história.  A IA poderia compor algo assim, mesmo com erro de concordância? A letra criada pela IA não é sonora, é tosca, simplista e ideal para a indústria fonográfica atualmente, como aqueles lixos que as Anittas da Vida cantam. O problema é da IA ou da baixa qualidade de compositores?

Então, o problema é que os humanos se acomodaram. Não fazem mais perguntas que demandam pensamento, não sabem fazer avaliações, testes ou provas. Nos testes de exames para licenciamento médico, podia ter questões tipo: “Um paciente já entrado nos 50 anos apresenta o pulmão esquerdo totalmente tomado por líquido. Exames de sangue apontaram altíssima taxa de indicadores infecciosos. O primeiro BAR deu negativo para tuberculose. O segundo BAR também deu negativo. O terceiro não pôde ser feito pois já tinha sido implantado um dreno e o paciente não apresentou mais secreção tipo “catarro”. Biópsias do pulmão não indicou tuberculose, mas ele foi tratado contra tuberculose fazendo uso do RIPE e se curou. Se todos os indicativos davam negativo para tuberculose, por que ele foi tratado mesmo assim?”

Postem a resposta nos comentários e vejam se vocês se saem melhor que a IA.

10 comentários sobre “O comodismo humano e a generalidade das IA

  1. resposta que obtive:

    “Ele foi tratado como tuberculose porque, apesar dos exames iniciais darem negativo, os sintomas e a aparência do pulmão indicavam a presença da doença. O tratamento foi feito como medida preventiva, já que a tuberculose é altamente contagiosa e pode ser grave se não for tratada corretamente. Além disso, as biópsias não conseguiram identificar a doença, então o tratamento foi iniciado com base na avaliação clínica e no histórico do paciente. O fato de ele ter se curado após o tratamento sugere que o diagnóstico e o tratamento foram corretos.”

    Como não sou médico e não entendo nada, essa resposta é condizente?

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  2. Elise

    Se o paciente apresentou edema pulmonar sem nenhum sintoma cardíaco, a chave são os exames de imagem. A IA não tem acesso a exames de imagem. Se o paciente foi tratado para tuberculose mesmo com todos os exames indicando que não se tratava de tuberculose, a resposta está em exames de imagem que provavelmente mostraram resultados compatíveis com a sintomatologia da tuberculose. Provavelmente os focos estavam com infecção em estágio inicial, por isso não foi possível detectar por meio de punção e biópsia.

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  3. “Na música, se ela for de baixa complexidade de composição, há o risco de uma ferramenta do tipo substituir o ser humano” – O que significaria o fim dessas canções de corno (aka sertanojo) bem como seria o fim dessas putarias verbais (aka funk) e de seus “artistas”.

    Tem gente que realmente acha algo do tipo ruim?

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  4. Émerqui Aguiar

    Vou tentar responder o questionamento (muito interessante, aliás) feito no final do texto.
    Eu precisaria saber quais agentes infecciosos foram detectados. O BAAR (ou Acid-Fast Bacilli Smear) em inglês pode dar resultados falso-negativos em pacientes imunocomprometidos. Além de que o teste BAAR não é muito sensível ou específico.
    Eu acredito fortemente que os resultados deram falso-negativo porque o paciente estava imunocomprometido e o uso de alguns medicamentos podem contribuir para isso, e já estava com um pulmão todo ferrado.
    O paciente, apesar de não ter resultado positivo (por conta de um falso-negativo), foi curado usando o esquema RIP porque tinha, de fato, tuberculose. Porém, eu pediria outros exames para confirmar minha hipótese, como o NAAT e inibidores PCR. O que me ferrou e complicou é que neste caso, mesmo com a biópsia teve resultado negativo, mas novamente, medicamentos interferem em exames (não necessariamente os remédios que estava tomando para tuberculose).
    Resposta final: Falso-Negativo para tuberculose devido a paciente imunocomprometido e possível interação medicamentosa com os poucos exames laboratoriais mencionados.
    É isso ou nem cheguei perto?

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